Escola – lugar de conviver e aprender

A escola é um espaço de aprendizagem e acolhimento.

Uma vez ocupada, pelos indivíduos e seus projetos, torna-se lugar do coletivo e do indivi­dual, das interações entre pares e com os pro­fessores, um lugar de encontros com outros para pertencer a um coletivo por meio dos saberes consagrados e dos valores constituídos.

No contexto escolar, marcadamente di­nâmico e diverso, as aprendizagens se dão por processos variados que visam a cada aluno e ao grupo todo, favorecendo o desenvolvimento de competências, habilidades, conceitos e atitudes criteriosamente escolhidos.

Historicamente, vivemos uma mudança im­portante de paradigma, segundo o qual, o esforço de adaptação e o engajamento do aluno aos processos de formação e aprendizagem cabem à escola. Ou seja, erigidas quaisquer barreiras resultantes do encontro do sujeito com o currículo da instituição, configura-se uma demanda por ações particulares e específicas que tornem possível e qualificada sua experiência escolar, o que inclui os repertórios compostos a partir das relações familiares e sociais que cada criança carrega. A demanda pode ser decorrente de questões de aprendizagem e de relacionamento com seus pares. As práticas inclusivas envolvem a flexibilização e a adaptação do conteúdo e da metodologia do que é trabalhado para que a criança aprenda, levando em conta sua condição e seu ritmo, assim como podem ser necessários manejos que permitam a presença do aluno no grupo. Em alguns casos, as duas ações são neces­sárias, ou seja, o suporte e a regulação emocional de um lado, e a adaptação pedagógica de outro.

Atender essa demanda no Santa Cruz, de acordo com esse novo paradigma, veio ao en­contro dos princípios humanistas que sempre permearam o ideário do colégio e nortearam nossos rumos educacionais. Considerar as diferenças e procurar lidar com elas com respeito e uma escuta que leve a compreendê-las melhor são traços de uma cultura institucional conse­quente e que visa sempre à intervenção mais apropriada e pertinente junto a cada estudante e ao grupo buscando caminhos para possibilitar o processo de aprendizagem e a posterior inserção como cidadãos.

A consonância de ações pautadas em prin­cípios inclusivos com a filosofia de nossa escola resultou em um processo intenso de preparo, estudos e reflexões para lidar com essa relevante questão com a mesma responsabilidade que sempre caracterizou o colégio. Assim, ampliar ainda mais o olhar para a diversidade de sujeitos, de modalidades de relacionar-se com o conhe­cimento, com professores e colegas constituiu­-se desde logo tarefa desafiadora, que levou os cursos de Ensino Fundamental 1 e de Educação Infantil a instaurar um projeto de muitas etapas, com o aporte de profissionais externos, que têm nos auxiliado na apropriação gradual desse relativamente recente campo de atuação.

Para organizar e fortalecer esse trabalho, foi criado o Núcleo de Práticas Inclusivas, que não apenas garante a articulação entre educadores, como também acompanha os alunos ao longo de sua escolaridade e favorece a interlocução, a formação e o apoio aos professores.

O objetivo dessas iniciativas é instrumenta­lizar as equipes de trabalho e, sobretudo, gerar um campo estruturado o mais solidamente possível a fim de oferecer segurança e suporte ao corpo docente para conduzir esses alunos no dia a dia, levando-os a aprender, a usufruir da escola o máximo que conseguirem, favorecen­do o desenvolvimento de suas potencialidades e sua experiência de pertencimento. Ou seja, precisamente o mesmo objetivo que procuramos atingir em relação a todos. Que se desenvolvam, realizem aquisições, que se socializem.

Além do atendimento aos alunos, o envol­vimento dos familiares na dinâmica escolar, por meio do acolhimento, da escuta e do compar­tilhamento de necessidades é algo que, a todo momento, precisa ser buscado e reafirmado, pois tal parceria é imprescindível para um aten­dimento harmonioso e efetivo do aluno.

Os espaços de discussões e de trocas, in­clusive com grupos de pesquisa que também se debruçam sobre essas questões, e os subsídios trazidos por profissionais externos propiciaram um processo grupal em que as demandas co­locadas pelas crianças que requerem práticas inclusivas se convertessem em tema de reflexão de toda a equipe de educadores de Ensino Fun­damental 1 e da Educação Infantil, com quem trabalhamos em consonância. Nesse contexto, compartilhamos experiências, construímos possibilidades, mesmo que o caminho ainda seja permeado de dúvidas e inquietações.

Imersos em questionamentos e aprendiza­gens promovidos pelas crianças que demandam adaptações constantes no tempo e no espaço escolares, nos materiais didáticos, na forma de promover interações entre colegas, outra ques­tão foi ganhando destaque em nossas reflexões: como trabalhar com crianças que, mesmo não necessitando de grandes adaptações de nosso projeto, também encontravam dificuldades para acompanhar as atividades de ensino? E, ainda, como propor desafios também aos que revelam fortes competências acadêmicas? O atendimento aos alunos em sua singularidade de necessidades e competências sempre mobilizou nossa atenção e nos colocou dilemas e desafios, porém de maneira pontual e localizada. Os professores vivenciavam as dificuldades decorrentes dos diferentes sabe­res, porém atuavam de maneira individualizada.

Apesar desses questionamentos, continua­mos entendendo a necessidade de mantermos horizontes claros com exigentes metas mínimas para todo o grupo. Temos expectativas de apren­dizagem que orientam nosso ensino e estimulam o engajamento dos estudantes.

Lidar com o tempo dos alunos, com suas necessidades, sem com isso deixar de atender e contribuir para configurar, em cada turma e em cada série, um coletivo de trabalho é, para nós, atualmente, um processo e uma busca de toda a equipe. Os professores vêm refletindo e aprendendo a manejar pedagogicamente os di­ferentes saberes de nossos alunos, sempre com a parceria e o acompanhamento de orientadoras e coordenadoras.

Nesse sentido, algumas iniciativas já fazem parte do nosso cotidiano: os grupos de apoio, por exemplo, aulas no contraturno do período escolar em que os alunos indicados contam com atividades especialmente planejadas para lidar com suas dificuldades e dúvidas, e um professor próximo para orientá-los, são práticas já consoli­dadas em nossa escola, que favorecem o avanço daqueles que encontram maior dificuldade em corresponder às expectativas de aprendizagem previstas em cada série.

Além dos grupos de apoio, outras possi­bilidades surgiram na rotina das diferentes classes: aulas em que se proponham desafios ajustados a diferentes grupos de alunos ou a organização da classe em estações de trabalho, em que os alunos se revezem entre situações que sejam realizadas individualmente e outras que pressuponham o trabalho em grupo, são formas de contemplar essa diversidade e, ainda, valorizar a troca entre pares. Atividades como a apresentação de seminários acerca de temas es­colhidos pelos alunos, em que cada um oferece sua contribuição na medida de seus interesses e possibilidades; a discussão das diferentes inter­pretações e emoções suscitadas por um texto literário desafiador ou o compartilhamento de variadas estratégias encontradas pelos alunos para resolução de problemas matemáticos também são exemplos em que a variedade de saberes dos alunos promove a troca e resulta na ampliação dos conhecimentos de todos. Nesse contexto, nossos alunos que demandam práticas inclusivas participam de várias dessas propostas, trazendo contribuições genuínas e pertinentes a suas vivências.

Motivados pela busca de alternativas e inovações, gostaríamos de nos aproximar da compreensão da escola como comunidade de aprendizagem, que nos parece promissora, por preconizar a constituição de ambientes que fa­voreçam e sustentem a aprendizagem enquanto promovem a interação e a colaboração entre seus membros (professores, alunos e todos os demais atores que intervêm no processo educativo), fortalecendo, também, o sentimento de perten­ça entre eles. Sua principal característica, que move todas as ações, é a ênfase na aprendizagem, ou seja, tudo o que ocorre nessa comunidade desenvolve-se em torno de ações que envolvam a construção de conhecimentos.

O protagonismo de cada um dos atores en­volvidos é ponto de partida, e o papel de cada participante complementa o dos demais. A di­versidade, nesse caso, é um valor, já que as expe­riências e características pessoais, as necessidades e potencialidades de cada um são consideradas no processo e contribuem para dar um sentido compartilhado às aprendizagens realizadas.

A criação de contextos que promovam a participação de todos pelo diálogo, entendido como suporte à reflexão, argumentação, refu­tação ou aceitação das ideias de cada um é cen­tral. A interação, como elemento fundamental dessa proposta, contribui para a legitimação do conhecimento culturalmente valorizado.

Compreender que uma sala de aula pode ser considerada uma comunidade de aprendizagem nos parece promissor, no sentido de promover um trabalho em que o aprender de cada um implique seu engajamento no processo e no qual os diferentes saberes e características dos alunos sejam valorizados.

Caminhar para uma cultura de valoriza­ção das diferenças é um processo que envolve muitos desafios, feito de conquistas e recuos, e exige um grande empenho de todos os atores envolvidos. No entanto, ao trilhar esse caminho, é possível perceber uma construção grupal em que todos, educadores, familiares e crianças, saem fortalecidos, sobretudo pelo reconheci­mento de que somos, como seres humanos, substancialmente diversos uns dos outros e que o acolhimento das diferenças favorece a todos, não apenas no espaço escolar, mas no convívio social mais amplo.

 

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