Colégio Santa Cruz: passado, presente, futuro

O passado é o presente na lembrança.
Ricardo Reis

A data oficial de fundação do então Ginásio Santa Cruz é março de 1952, mas de fato ele foi pré-fundado em outubro de 1951, quando foi criado um curso de Admissão ao Ginásio que preparava os alunos para o ingresso no Ginásio, mediante exames classificatórios. Contrariamente ao que aconteceu há algum tempo, esse exame era não só permitido, mas era obrigatório. O Ginásio funcionou até 1956 num prédio da Arquidiocese de São Paulo situado na Avenida Higienópolis, 890. A partir de 1957, o já Colégio Santa Cruz se instala no Alto de Pinheiros, rua Bellini s/n, hoje Avenida Arruda Botelho, 255.

Desde os seus inícios, o Colégio sempre manteve uma postura educacional coerente com os princípios humanos e evangélicos que privilegiam a formação integral da inteligência, do corpo e do coração, uma educação voltada para a liberdade responsável e para a responsabilidade social. Essa orientação prevalece no Colégio e na mente dos educadores até os dias que correm, em que pesem todas as transformações ocorridas ao longo desses últimos sessenta anos de história.

Ao lado dessas constantes, houve muita evolução, que acredito positivas, como, aliás, não poderia deixar de ser, em qualquer país, quanto mais no nosso que não só mudou, mas mudou muito, cresceu exponencialmente e se modernizou. Não somos mais o país levemente urbanizado do início dos anos cinquenta. A população cresceu quatro vezes no país e, na grande São Paulo, muito mais. Tudo mudou, complexizou-se e, por isso mesmo o Colégio teve de mudar. Não temer o futuro e mudar sempre que necessário é uma das marcas do nosso Colégio. Mas o que mudou?

A mudança mais óbvia é que ele cresceu: hoje tem mais de 3.000 alunos. Em 1957, ao transfe­rir-se para o Alto de Pinheiros, contava com aproximadamente trezentos alunos nos cursos ginasial e colegial.

Outra mudança consistiu na retirada paulatina dos padres educadores que fundaram o Colégio. Os padres que, no início dos anos sessenta, passavam de dez, todos, menos um, se foram, e ficaram os leigos… na direção, na administração, na docência, na catequese, na orientação pedagógica e em tudo o mais. Mas nada se perdeu em qualidade em todas essas áreas. O Colégio continua sempre no topo da lista da excelência acadêmica.

Mudou a filiação religiosa dos alunos. Antes, os alunos eram quase todos católicos, e o Colégio levava isso em conta. Hoje, a maioria ainda é católica, mas já há uma forte minoria de não católicos, e o Colégio também leva isso em conta. Há um Ensino Religioso curricular de cunho ecumênico e pluralista para todos os alunos e há também uma Catequese para os alunos católicos que a desejam. A dimensão religiosa é muito importante, mas não há proselitismo e sim diálogo religioso; promove-se o testemunho cristão e católico nas aulas de ensino religioso, e todos são convidados a participarem das celebrações litúrgicas preparadas com muito carinho não só nas grandes datas, mas diariamente e aos domingos.

Outra mudança substancial, ou seja, a coeducação de meninos e meninas, alterou a atmosfera do Colégio, tornando-o mais humano e completo, e ninguém pensa sequer em voltar atrás. Além disso, nos anos setenta, foi criado o antigo Primário, hoje Fundamental 1, ao lado do Fundamental 2, antigo Ginásio. No início da primeira década do milênio foi criado o curso de Educação Infantil, aberto principalmente para facilitar às famílias dos nossos pais de alunos manter todos os seus filhos na mesma escola. Os alunos que perseveram passam conosco os 14 anos de escolaridade pré-universitária.

Desde os anos setenta, temos o Curso Supletivo, hoje Educação de Jovens e Adultos (EJA), com 500 alunos, e um curso de Ensino Técnico de nível médio, com perto de 100 alunos, com possibilidades de ampliação de matrículas, uma vez mais conhecido o seu público potencial. Esses cursos são totalmente gratuitos e são a menina dos olhos dos nossos educadores.

Outro passo importante foi a criação, um pouco antes da passagem da Direção do Colégio para os leigos, do Conselho Administrativo do Colégio Santa Cruz. Esse mesmo Conselho foi reestruturado e revigorado na passagem da última administração para a atual. A atual direção do Colégio pode contar com a experiência extraordinária de conselheiros, ex-alunos, pais de alunos, grandes amigos e religiosos de Santa Cruz. Longe de ser um órgão decorativo, é um órgão competente e dedicado, que faz a diferença.

O Colégio sempre conviveu com a pecha de ser uma escola para ricos. Esse já era um problema mesmo antes da sua fundação. Havia religiosos dentro da Congregação de Santa Cruz que não queriam a fundação de um colégio, por considerar que não teriam condições de atender aos que mais necessitavam. Os padres favoráveis à abertura achavam que, mesmo que não pudesse atender à população mais carente, poderia formar cidadãos responsáveis que, indireta ou diretamente, seriam capazes de promover os mais carentes. Temos certeza de que essa previsão estava certa. O Colégio já forneceu à sociedade brasileira quadros importantes na administração pública, nas finanças, na indústria, nas artes… mas como ele tem convivido com esse problema da nascença?

O Colégio Santa Cruz continua sendo uma instituição particular sem verbas públicas, portanto continua dependendo das anuidades dos alunos para sobreviver prestando serviços. Mas nem por isso o Colégio sente-se desobrigado em relação aos menos favorecidos. Esta escola alimenta em todos os seus níveis um senso agudo do social e tenta contribuir para que essa preocupação se difunda na sociedade; e isso não só por meio da catequese, do ensino religioso, dos projetos em Ética e Cidadania, mas também do Voluntariado Educativo em creches e instituições de caridade. Alem disso, com a ajuda do SAN, que todos conhecem, o Colégio viabiliza na Vila Nova Jaguaré várias creches, centros de juventude, ensino profissionalizante, assistência familiar e outras mediações assistenciais e educativas. Vale lembrar o atendimento de crianças em creches e de outras atividades com crianças e adolescentes. Cálculos realistas nos permitem pensar que, por meio do seu braço social, dos seus funcionários de baixa renda e dos operários das obras em construção, o Colégio Santa Cruz atende mais pessoas carentes do que afortunadas.

Antes de terminar lembremos os nossos mortos. Recentemente fomos informados do falecimento de vários religiosos de Santa Cruz que trabalharam em nosso Colégio. Lembremos-lhes os nomes: Lionel Corbeil, Gilles Beaulieu, Georges Picard, Paul Grenier, Léo Morin, Gérard Laporte, Paul-Eugène Charbonneau, Claude Parent.

Entre os vivos ainda podemos contar com André Roussel, Yvon Lafrance, Yvon Laurence, Laurent Roberge, Robert Grandmaison, Agnelo Filinto e José Prado.

O Colégio Santa Cruz atravessou bravamente estes mais de sessenta anos de história e é considerado por todos como um empreendimento vencedor, mas os que nele trabalham, refiro-me a todos eles, sabem que o Colégio, mantido por uma entidade sem fins lucrativos, segundo um modo de pensar não exclusivamente jurídico, não se pertence e não é de ninguém em particular. Ele pertence à sociedade, nome laico do que o Concílio Vaticano II chamou de Povo de Deus, e só nele encontra a sua razão de ser. Desejamos que o Colégio Santa Cruz jamais perca a sua alma, uma alma católica, cristã, ecumênica, aberta ao diálogo e à própria conversão…

(1) Texto lido na homilia das missas de ação de graças pelos 60 anos do Colégio Santa Cruz, realizadas em 13 e 14 de setembro de 2012.

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