45 anos de EJA

 

O curso de Educação de Jovens e Adultos (EJA), que com a Educação Profissional compõe os Cursos Noturnos do Colégio Santa Cruz, completa, em 2019, 45 anos de existência. Fundado como o antigo Supletivo, este projeto oferece Ensino Fundamental e Médio a jovens e adultos que não puderam frequentar a escola na idade regular.

Ao longo desses 45 anos, o cenário da educação brasileira passou por diversas transformações. É fato, por exemplo, que houve ampliação do acesso à escola e queda do analfabetismo. Seguimos, porém, como um país onde quase metade das pessoas com 25 a 64 anos não completou sequer o Ensino Fundamental e onde o analfabetismo acomete 7% da população. Apesar da demanda potencial pela EJA, este segmento vem sendo relegado a um campo marginal nas políticas públicas brasileiras. Ao manter um já longevo programa de EJA, o Santa Cruz afirma seu reconhecimento da importância desta oferta no contexto brasileiro e o compromisso com uma camada da população frente à qual o Estado mantém uma dívida social e histórica.

A EJA do Santa Cruz atende, semestralmente, cerca de 450 estudantes que, somados àqueles que frequentam a Educação Profissional, perfazem um contingente de 600 alunos bolsistas dos Cursos Noturnos.

Se permanece a demanda, temos assistido a uma transformação do perfil dos alunos e das alunas que chegam ao Colégio no cair da tarde. Essas mudanças, ocorridas nas últimas duas décadas, conversam de perto com a história da cidade e do país.

Faixa etária

A idade média dos nossos alunos, que era de 27 anos em 2001, hoje está na casa dos 40 anos. Como ocorre no Brasil como um todo, os menos escolarizados são os mais velhos, o que traça o perfil de um grupo socialmente mais vulnerável.

Ao contrário da tendência nacional de aumento dos jovens na EJA, temos constatado um encolhimento da parcela de alunos com até 25 anos em nosso curso. Eles correspondiam a 31% do alunado em 2001 e hoje se restringem a 10%. Essa redução tem sido acompanhada por profunda mudança de perfil dos alunos dessa faixa etária. Se antes a maioria dos jovens era migrante, gente que não teve acesso à escola em áreas rurais, hoje eles são basicamente filhos de migrantes, nascidos já na Grande São Paulo; costumam ter experiências de vida urbana, com passagens recentes por escolas da rede pública nas quais não concluíram os estudos. Em nosso curso, eles concentram-se no final do Ensino Fundamental e no Ensino Médio.

Local de nascimento

Desde sua criação, a EJA do Santa Cruz atende um grande contingente de alunos migrantes, principalmente nordestinos e mineiros. Embora esse quadro persista, uma nova tendência insinuou-se nos últimos anos: a relativa diminuição da parcela de migrantes e o aumento de gente nascida na Grande São Paulo (caso dos jovens citados anteriormente). O traço migrante, ainda marcante, parece perder força, possível reflexo da ampliação do acesso à escola em áreas rurais do Nordeste e de Minas Gerais, da desaceleração do fluxo migratório dessas regiões em direção a São Paulo e do aumento da migração de retorno.

Sexo

Em nossa EJA, repete-se a tendência nacional de predomínio das mulheres em relação aos homens: o curso vem se tornando cada vez mais feminino. As mulheres, que em 2001 respondiam por 54% das matrículas, hoje representam 61% do alunado. Nota-se ainda que a idade média das mulheres (41 anos) é superior à dos homens (31 anos). Esses dados se explicam pela maior frequência com que as mulheres abandonam a escola na idade regular, principalmente pela impossibilidade de conciliar os estudos com a maternidade. Elas então parecem “demorar” mais do que os homens para reassumir a condição de estudantes, o que só podem fazer depois que os filhos estão crescidos.

Local de moradia

A EJA do Santa Cruz deixou de atender a pessoas que, em sua maioria, vivem no entorno do Colégio. Os residentes nos bairros de Pinheiros e Alto de Pinheiros, que em 2001 representavam a terça parte dos alunos, hoje respondem por apenas 8% das matrículas. A especulação imobiliária da região e a redução dos postos de trabalho em que se dorme no emprego dispersaram os alunos para as periferias de São Paulo e para os municípios vizinhos, como Taboão da Serra, Osasco e Embu das Artes. Muita gente ainda trabalha perto do Colégio, mas o caminho de volta para casa tornou-se mais longo.

A mudança do perfil dos alunos da EJA solicita respostas educacionais e pedagógicas e, assim, alimenta o incessante exercício de pensar a respeito do quê e do como ensinar. Novos perfis trazem consigo outras experiências prévias, relações com os conhecimentos escolares, modos e ritmos de aprendizagem. Também nos convidam a conhecer as novas expectativas que, possivelmente, venham ser depositadas sobre a escola. Uma sala de EJA reúne um grupo de pessoas altamente diversas em relação à trajetória biográfica, à faixa etária e aos projetos de vida: há quem pretenda ingressar em um curso técnico ou superior, conseguir um emprego, conquistar uma vaga de trabalho com maior prestígio e remuneração, ampliar a formação cultural, ter uma vida social ou “apenas” obter um diploma.

Jovens e adultos não retornam à escola para repor o que deixaram de ter no passado, mas para satisfazer necessidades e desejos do presente. Logo, os 45 anos de nossa EJA devem ser celebrados como um marco histórico de realização, mas também de construção – que sabemos incessante – de um currículo capaz de atender a esperanças tão diversas por novas formas de participação social e política neste mundo.

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